A responsabilidade civil pela reparação de dano ambiental em imóvel: uma obrigação que acompanha a propriedade

A aquisição de um imóvel vai muito além da simples transferência de um bem. Ao assumir sua titularidade, o adquirente recebe também um conjunto de direitos e deveres que passam a acompanhá-la. Entre esses deveres, um dos que mais gera impacto — tanto jurídico quanto financeiro — é a responsabilidade pela reparação de danos ambientais. 

Surge, então, uma dúvida recorrente: quem compra um imóvel pode ser responsabilizado por uma contaminação ou degradação ocorrida antes da aquisição? A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) já consolidou a resposta: sim, e isso se deve à natureza propter rem dessas obrigações. 

A chamada obrigação propter rem é aquela que está intrinsecamente ligada ao bem. Ela não depende apenas de quem causou o dano, mas da própria existência da coisa — no caso, o imóvel. O art. 2º, § 2º, da Lei nº 12.651/2012 (Código Florestal) deixa isso expresso ao afirmar que as obrigações ambientais têm natureza real e são transferidas ao sucessor quando há mudança na titularidade. Em outras palavras, quem adquire um terreno já degradado, contaminado ou com Área de Preservação Permanente suprimida assume automaticamente o dever de repará-lo, ainda que não tenha tido qualquer participação no dano. 

A jurisprudência do STJ reforça esse entendimento ao afirmar que a responsabilidade civil por danos ambientais é objetiva e solidária. É objetiva porque prescinde de comprovação de culpa, bastando a demonstração do dano e do nexo causal. E é solidária porque a reparação pode ser exigida tanto do proprietário atual quanto dos anteriores. Não à toa, a Súmula 623 do STJ estabelece que “as obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor”. 

Esse caráter solidário confere ao Poder Público e ao Ministério Público um instrumento eficiente para exigir a recuperação ambiental. É comum que a ação seja direcionada tanto ao atual proprietário quanto ao causador original da lesão, cabendo ao credor da obrigação escolher contra quem irá demandar. O STJ também reconhece que a inércia do proprietário atual diante de uma degradação preexistente configura omissão ilícita, perpetuando o dano. No julgamento do REsp 1.962.089/MS (Tema Repetitivo 1.204), consolidou-se que somente o alienante que não contribuiu para a degradação e que deixou de deter o direito real antes do dano pode ser excluído da responsabilidade. 

Diante desse panorama, a realização de uma due diligence ambiental (auditoria prévia que investiga e avalia os passivos ambientais de um imóvel) antes da compra de um imóvel deixa de ser mera precaução para se tornar um passo essencial. Identificar passivos ambientais previamente pode evitar surpresas e impedir que o adquirente assuma um encargo financeiro significativo e inesperado. 

A mensagem da legislação e da jurisprudência é clara: a proteção ambiental é um dever coletivo e acompanha o imóvel ao longo de sua história. Quem se torna proprietário assume também a missão de preservar e, quando necessário, restaurar o meio ambiente. 

Por Caroline D’Agostino, Coordenadora Jurídica na Arnone Advogados Associados